12.3.06

Do valor intrínseco das coisas


Quem conhece Deus

sente coisas internas

e é amigo dos morangos

que nunca morrem.


Ando assim meio sem vontade de andar de seguir pela vida vivida por outras facetas de mim. Eu quero simplesmente andar sem pensar entender. Quero simplesmente viver sem emoções dores de paixões loucuras ou aventuras. Eu quero viver a vida pequena da borboleta amarela ao lado de outras comuns a ela. Viver voando, provar das flores. A vida inpensada. Feliz por isso. Nada além da alegria diante de uma comida, um cafuné ou uma tarde de sono. Um cachorro que abana o rabo faceiro para um dono que estapeia sua orelha. Eu quero sentir o prazer das coisas vãs. Das coisas. A coisa. Uma boa cama uma boa mesa um bom sofá. O bom e velho tapete encardido que reflete a minha alma de velha, caduca e rabujenta. As coisas às vezes parecem tão mais humanas e companheiras. Quem dorme na cama comigo senão um livro? Quem conhece as curvas do meu corpo além da minha velha cama? Objetos-gente, objetos-bússula, objetos-companhia. Tornei-me coisa, hoje sou uma coisa que gosta de coisas, me disperta mais interesse. Pessoas-coisa são imóveis e frias sem graça ou beleza, pessoas-coisa saltitam, cambalhotam... Tolas. Coisificam-se. Qual a função do objeto senão ser usado? Coisas pelo menos não tentam ser gente daí sua beleza. A imobilidade móvel em expansão. O que seria de mim sem um lápis e um papel? Eu não sou nada, quero ficar estática e muda no canto de uma sala toda cheia de biscuit. A bailarina do soldadinho de chumbo. Hoje há mais graça na quietude.


Henrique do Valle, Os Morangos são eternos.

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